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  • Vol. 18 No. 2

    Neste número da revista Conjectura: filosofia e educação que ora apresentamos, queremos convidar os leitores a refletirem a partir de textos que veiculam resultados de pesquisas sobre problemas situados na interface entre educação e filosofia. As questões abordadas versam sobre a formação integral, a educação infantil, a extensão universitária, o conservadorismo, a mestiçagem brasileira, a relação entre estética e ética e as múltiplas teorias e concepções de democracia.O primeiro texto, intitulado A extensão universitária a partir de Jürgen Habermas e Enrique Leff, de autoria de Vilmar Alves Pereira e Leonardo Dorneles Gonçalves, discute a relação entre modernidade e racionalidade, a partir de Habermas e Leff, aproximando tal discussão do terreno da educação ambiental. Procura compreender em que medida a acepção de racionalidade ambiental pode contribuir, em nossas práticas educativas, no contexto da extensão universitária.O segundo texto, de Milena Aragão, Jordana Wruck Timm e Lúcio Kreutz, intitula-se A história oral e suas contribuições para o estudo das culturas escolares. Pretende evidenciar a história oral como um caminho metodológico para os estudos das culturas escolares, de modo a recuperar os registros do passado através da subjetividade dos sujeitos de hoje.A seguir, apresentamos o texto Educação integral e os espaços educativos: um diálogo necessário, de Mercês Pietsch Cunha Mendonça, Iolene Mesquita Lobato e Cleonice Borges Ribeiro Faria. O estudo defende o diálogo entre comunidade e escola para o projeto da escola de educação integral. Algumas das questões abordadas: Como transformar escolas públicas em instituições capazes de promover de fato essa formação? Quem são esses educadores de tempo integral? Como serão pensadas e articulas as oficinas que possibilitem a este público essa formação completa, integral?A formação integral: um desafio pedagógico, de Rosa de Lourdes Aguilar Verástegui, analisa as Cartas sobre a Educação Estética do ser Humano (1791-1793) de Schiller. Schiller propõe uma educação harmonizadora que equilibre o ser humano, por meio da experiência estética. Ética e estética convergem porque a estética mantém o equilíbrio do indivíduo de tal maneira que, graças ao domínio racional das pulsões, além de aspirar a um estado estético, o ser humano pode chegar ao estado político, que é a garantia da autonomia.O quinto texto, intitulado Aspectos da educação da criança na história da filosofia da educação: a perspectiva de filósofos e educadores, é de Heraldo Aparecido Silva e Fernanda Antônia Barbosa da Mota, e reúne diferentes concepções sobre a educação das crianças na perspectiva de filósofos e educadores: Platão, Montaigne, Descartes, Locke, Rousseau, Kant, Vygotsky, Dewey, Piaget e Lipman. A partir da compreensão dos avanços e retrocessos no estudo da educação da criança, defende a necessidade e a relevância do estudo dessa temática no âmbito acadêmico, particularmente, na disciplina Filosofia da Educação.O sexto texto é de autoria de Wilson Francisco Correia e se intitula que é conservadorismo em educação?. Procura evidenciar como o pensamento conservador interferiu no campo educacional durante as reformas educacionais realizadas nos anos 90. O autor mostra que, hoje, vivemos na vigência de marcos legais e diretrizes filosófico-pedagógicas lastreadas nos imperativos que orientaram as reformas político-econômicas, ideológico-culturais e epistêmico-educativas afeitas às necessidades do sistema capitalista, então hegemônico no período pós- Guerra-Fria.Em Questões conceituais de ética em educação, Maria Judith Sucupira da Costa Lins defende que, para se tornar inteiramente humana, cada pessoa precisa se sentir integrada à humanidade, e isso somente é possível por meio de conceitos universais de ética.No oitavo texto, intitulado A contribuição do sincretismo brasileiro para a construção de uma ética global, Renato Somberg Pfeffer sustenta que a mestiçagem cultural brasileira é um exemplo da possibilidade de um mundo mais humanizado. A partir dessa herança pluricultural é possível pensar um movimento ecumênico de povos que, para afirmarem-se, não precisariam negar o outro. No intuito de comprovar essa hipótese, o texto discute a questão da filosofia intercultural e sua relação com o espírito latino-americano e o centro de força da cultura brasileira, enfatizando sua originalidade e vocação histórica de acolhimento universalista, de tolerância e cordialidade.A seguir, de autoria de Juan Carlos Mansur Garda, apresentamos o texto La belleza, horizonte de sentido. Nele, Mansur Garda propõe valorar a contemplação da beleza como guia existencial na vida do homem e aborda o narcisismo como uma via não autêntica de se aproximar da beleza. Por fim, propõe o correto exercício do gosto, como uma forma para encontrar beleza, mesmo em ocasiões em que não seja fácil encontrá-la no mundo.Marta Rios Alves Nunes da Costa, em Democracy and democracies: between theory and facts, dialoga com Robert Dahl, Benjamin Barber, Robert Goodin e David Plotke, evidenciando que há tantas teorias quanto perspectivas sobre democracia. Após desenhar o contexto geral para uma reflexão crítica sobre democracia e defender que a instanciação dos vários modelos democráticos depende da importância que se confere a cada um dos critérios, Costa procura identificar as implicações dos modelos representativo, participativo e deliberativo e uma forma de redefinição da democracia mais positiva para o futuro, tendo o orçamento participativo como prática exemplar a seguir.Completam este número a resenha de Paulo Tiago Cardoso Campos da obra Grandes questões da ciência, de Harriet Swain, a resenha de Diogo da Silva Roiz da obra Represálias selvagens: realidade e ficção na literatura de Charles Dickens, Gustave Flaubert e Thomas Mann, de P. Gay e a resenha de Marcos André Webber da obra Ensaio filosófico sobre a dignidade: antropologia e ética das biotecnologias, de Bernard Baertschi.Boa leitura!
  • Vol. 18 No. 1

    Estamos vivendo um momento sociocultural histórico em que as tecnologias digitais nos envolvem em todos os setores e aspectos de nossas vidas. Termos como blog e Facebook e expressões como cultura digital, inclusão digital, letramento digital, dentre outros, estão presentes em nossos estudos, pesquisas, reflexões e discussões. Parece que há uma necessidade (imposição?) de trazermos as tecnologias digitais e seus desdobramentos para o cenário educativo: salas de aula, práticas docentes e cultura escolar.

    Se por um lado isso se justifica, uma vez que é um elemento da sociedade que demanda por uma educação plena para seus sujeitos, por outro, a inserção dessas tecnologias parece necessitar ir além da mera presença, sendo processo que provoque inovação e redimensionamentos. Pelo volume de textos oriundos de investigações e de reflexões em torno desse tema, podemos dizer no mínimo que está havendo um desencadear de perturbações, no sentido piagetiano. Algumas mais profundas; outras nem tanto, mas as perspectivas parecem ser positivas no sentido de que essas perturbações possam gerar mudanças inovadoras.

    Lemos (2009) comenta que um dos princípios da cultura digital é a possibilidade de emitir em rede, conectar-se com outras pessoas, produzir laços e fluxos de conversação. Essas ideias e as de Pierre Lévy sobre cibercultura nos levam a pensar que a forma como as subjetivações estão acontecendo está sendo modificada. As formas de conviver e de interagir também estão sendo influenciadas e, sendo assim, podemos pensar que as formas de aprender e de conhecer também podem estar sofrendo mudanças ou acontecendo por caminhos diferentes dos que havia antes do advento dessas tecnologias e dos dispositivos digitais móveis.

    Considerando a complexidade do processo educativo, as várias possibilidades de mediar e planejar esse processo, as potencialidades das tecnologias digitais disponíveis e a subjetividade dos professores e estudantes, podemos dizer que não existe uma forma única ou mais adequada de pensar esses processos, mas alternativas que estão em função de vários fatores, dentre eles, o contexto, a área do conhecimento, a cultura escolar onde o processo se desenvolve. É importante destacar que não são as tecnologias digitais que irão redimensionar as práticas vigentes. Tais práticas carecem de mudanças para atender aos desafios e às demandas contemporâneas por uma educação que desenvolva criatividade, autonomia e senso crítico. No entanto, as tecnologias podem ser agentes propulsores que perturbam e problematizam essas práticas e seu entorno, fazendo surgir um repensar e, em alguns casos, inovações nas práticas educativas em andamento.

    Diante desse cenário brevemente descrito, apresentamos esse número da revista Conjecturafilosofia e educação, onde trazemos as vozes de pesquisadores através de seus textos, juntando-as a várias outras e aos leitores, para que o diálogo em torno das possibilidades da interlocução das tecnologias digitais com os processos educativos seja realizado de forma a beneficiar a educação e a responder de forma satisfatória às demandas de nossa sociedade contemporânea.

    No primeiro artigo, A formação de professores nas políticas públicas de inclusão digital: o programa UCA-Erechim (RS), os autores Adriana Richit e Marcus Vinícius Maltempi analisam alguns aspectos do programa Um Computador por Aluno (UCA) relacionados à formação docente, lançando luzes para as implicações dessa formação nos processos de ensino e de aprendizagem e à promoção da inclusão digital na escola pública. Os autores sugerem que o processo de inclusão digital precisa fomentar novas formas de conhecimento e participação social para professores e estudantes.

    O segundo artigo, Ambientes virtuais de aprendizagem e formação continuada de professores na modalidade a distância, é de autoria de Miguel Alfredo Orth, Fabiane Sarmento Oliveira Fuet, Janete Otte e Marcus Freitas Neves. Nele, os autores analisam a formação continuada de professores por meio do ambiente virtual Moodle, na modalidade a distância, focando a integração hipermidiática das tecnologias nesse ambiente. Os autores mostram, no contexto pesquisado, que a integração da hipermídia potencializa o diálogo-problematizador, a interatividade e o desenvolvimento da flexibilidade para o processo de aprendizagem. Isso, segundo os autores, viabilizou aos participantes a realização de diversas associações entre diferentes conteúdos inter-relacionados, proporcionando, assim, uma ampliação da visão sobre os assuntos educacionais abordados na disciplina, o que, por sua vez, pode facilitar a transposição para seu fazer docente.

    No terceiro artigo, Avarte: uma alternativa pedagógica à exclusão digital, os autores Elisabeth Brandão Schmidt e Michelle Coelho Salort concebem cultura como toda a produção artística e científica, além dos costumes e crenças conservadas de uma geração para outra e apresentam a linguagem como elemento fundamental da evolução humana, discutindo as manifestações das tecnologias da inteligência como artefatos que servem de elementos constitutivos de nosso desenvolvimento. Destacam que a cultura digital precisa ser concebida a partir de uma construção histórica e defendem a utilização de ambientes virtuais, em especial o AVArte, um ambiente virtual de Arte/Educação Ambiental, como influenciadores do desejo de aprender e como alternativas para a exclusão digital, a qual ainda é uma realidade em muitas escolas brasileiras.

    No quarto artigo, Educação superior e processos de ensino e aprendizagem em EaD: os casos UCS e UFRGS, Andréia Morés discute a contextualização da educação superior na contemporaneidade, seus desafios e exigências demandados pelos novos tempos e espaços de formação em relação aos estudos da Educação a Distância (EaD). Em seus estudos, a autora defende que a EaD, mediada pelas tecnologias digitais, apresenta características que parecem produzir mudanças na cultura dos sujeitos, tornando-os autônomos, participativos e integrantes da cultura digital.

    O quinto artigo, Identidades nerd/geek na Web: um estudo sobre pedagogias culturais e culturas juvenis, é de autoria de Angela Dillmann Nunes Bicca, Ana Paula de Araújo Cunha, Márcia Helena Sauaia Guimarães Rostas e Max de Lima Jahnke. Nele, os autores analisam blogsda Internet como espaços educativos nos quais se produzem e constroem as identidades juvenis de indivíduos que buscam se inserir no grupo cultural conhecido como nerd/geek. Mostram que, ao colocarem em circulação representações de identidadesnerd/geek, os blogs analisados contribuem para a produção discursiva dessas mesmas identidades em função dos modos como os integrantes desse grupo partilham formas de apropriar-se de saberes diversos, de utilizar equipamentos tecnológicos e de consumir produtos comerciais e textos midiáticos.

    O sexto artigo, Jogos eletrônicos e aspectos morais: a borda entre o virtual e o atual, de autoria de Daniela Karine Ramos, discute aspectos relacionados à virtualização e à liberdade presentes nos jogos eletrônicos que se configuram como novos espaços de vivências, interação e subjetivação. A autora usa a cartografia como recurso metodológico para captar a singularidade presente na relação que os jogadores estabelecem com o espaço virtual. Ela conclui que, no contexto estudado, os jogos eletrônicos, como espaços virtuais, permitem lidar com a noção de tempo de forma diferenciada, aumentando o grau de liberdade e flexibilizando aspectos morais, trazendo à tona a noção de ciberética.

    O sétimo artigo, No cenário da pós-modernidade: a reiterada exigência de qualidade e excelência na educação contemporânea, dos autores Maria Lúcia de Amorim Soares, Eliete Jussara Nogueira e Luiz Fernando Gomes, analisa a reiterada e repetida demanda pela qualidade e excelência exigidas pela sociedade frente à educação contemporânea. Considerando alguns aspectos da modernidade e da pós-modernidade, eles enfatizam, de forma provocadora, que a educação vive a sua crise de finalidade, não encontrando referências ou modelos para atualizar-se, uma vez que seu impulso legitimador foi diluído quando o cânone moderno de padrões objetivos de conhecimento e organização em que se baseava o mundo foi desacreditado frente a um cenário pós-moderno.

    O oitavo artigo, Redes sociais: espaço de aprendizagem digital cooperativo, de autoria de Marcus Vinícius de Azevedo Basso, Aline Silva de Bona, Cristina Maria Pescador, Cristiane Koehler e Léa da Cruz Fagundes, discute a possibilidade de utilizar as tecnologias digitais online e as redes sociais como espaço digital de aprendizagem de uma maneira que favoreça a cooperação entre os estudantes. Este estudo foi baseado em uma pesquisaação, nas aulas de Matemática, realizada com estudantes do ensino médio. Os resultados desse estudo indicaram que os estudantes se apropriaram do espaço de aprendizagem digital como o Facebook e apontaram-no como potencializador da aprendizagem cooperativa.

    O nono artigo, Tecnologias virtuais na educação incidindo no universo simbólico do professor, de autoria de Anna Rita Sartore, apresenta um estudo interpretativo a respeito dos efeitos da presença das tecnologias conectadas à rede mundial de computadores, sobretudo os dispositivos móveis, que se alastraram como objeto de desejo por toda a parte. A autora analisa a inserção dessas tecnologias, por meio de políticas públicas, nas escolas da rede, ponderando sobre resistências e tensionamentos que surgem nesse processo de inserção. Ela busca pistas dessa oposição silenciosa a partir das alterações promovidas pela virtualidade na relação simbólica do sujeito com o meio, incidindo na esfera de sua identidade.

    No artigo de número dez, Teoria crítica da sociedade: um olhar sobre a educação em tempos de sociedade tecnológica, os autores Luiz Antonio Calmon Nabuco Lastória, Bruno Perozzi da Silveira, Jéssica Raquel Rodeguero Stefanuto, Juliana Carla Fleiria Pimenta e Juliana Rossi Duci apresentam suas reflexões a respeito das contribuições da chamada teoria crítica da sociedade para o campo da educação em tempos de crescente desenvolvimento tecnológico. Sob essa perspectiva, a educação autorreflexiva e autocrítica é pensada em seu potencial para a superação das condições de dominação que permanecem em nossa sociedade, cada vez mais tecnificada e pretensamente democrática.

    No último artigo, Comprendre les liens professionnels entre le RASED et les équipes éducatives: intérêt des traitements statistiques fondés sur la complémentarité du quantitatif et du qualitatif, os autores, Jean-Claude Régnier e Marie-Françoise Crouzier, apresentam uma pesquisa baseada nas relações profissionais de professores de escolas primárias, cujocorpus de estudo, construído a partir de entrevistas, foi analisado numa abordagem estatística. A operacionalização do tratamento tornou-se possível através da utilização de uma ferramenta, o software SPAD (Sistema de Análise de Dados Portable) de CISIA, que permite descriptografar o corpusobtido pelos métodos de análise fatorial de correspondências múltiplas.

    Finalizando as contribuições desse número da revista, apresentamos quatro resenhas: a primeira, de Marcelo Luís Fardo, do livro The gamification of learning and instruction: game-based methods and strategies for training and education de Karl M. Kapp; a segunda, de Jerônimo Becker Flores, do e-book Aprendizagem em ambientes virtuais [recurso eletrônico]: compartilhando ideias e construindo cenários, organizado por Eliana Maria do Sacramento Sores e Carla Beartis Valentini; e a terceira, de Lucas Mateus Dalsotto, do livro A ideia de justiça, traduzido por Denise Bottmann e Ricardo Doninelli Mendes, de autoria de Amartya Sen.

    Em nome de todos, agradecemos aos autores pela valiosa contribuição a esse número da revista Conjectura. As reflexões, ponderações e provocações propostas aos leitores, pesquisadores e professores são um convite ao diálogo, a repensarmos as nossas práticas de docência e de pesquisa, buscando formas inovadoras de sermos, conhecermos e convivermos.

     

    Prof. Dra. Eliana Maria do Sacramento Soares

    Organizadora

  • Vol. 17 No. 3

    Apresentação

    O presente número da revista Conjectura: filosofia e educação reúne oito artigos que versam sobre as mais diferentes questões da ética.
    O primeiro texto, de Wanderley J. Ferreira Júnior, intitula-se Condições de possibilidade para o pensar e o agir ético: a experiência da diferença e do outro. Analisa o caráter da experiência de pensamento e a exigência de ruptura com uma determinada imagem do pensamento consolidada pela própria tradição filosófica e por nossa prática como professores de filosofia e sujeitos éticos. Efetua uma crítica à ética universal e à ideia de sujeito universal que lhe é subjacente num contexto em que se proclama a morte do sujeito.
    No texto seguinte, os professores Luiz Síveres e Paulo Giovanni Rodrigues de Melo colocam em evidência uma proposta sobre educação e os respectivos pressupostos para que ela aconteça no sujeito, tendo como referência a pedagogia da hospitalidade com base na filosofia da alteridade em Levinas. Nesse caso, a educação não é vista a partir do movimento do eu em direção ao Outro, mas o contrário. Precisamente o Outro assume o protagonismo pedagógico já que o eu se abre à possibilidade de acolhida do Outro sem nenhum critério preestabelecido de forma assimétrica.
    No texto Noções introdutórias sobre a ética das virtudes aristotélica, Idalgo J. Sangalli e Jaqueline Stefani apontam à necessidade de compreender adequadamente os conceitos principais da ética aristotélica, a fim de poder indicar possíveis contribuições para o debate em torno da necessidade de uma formação moral e ética nos ambientes educativos. "Saber viver", para além do conhecimento científico e mesmo do conhecimento do bem, significa desenvolver habilidades de deliberar bem, de escolher acertadamente o rumo da vida, visando sempre ao melhor dos bens: a felicidade. Isso exige entender a estrutura e as funções das partes anímicas responsáveis pelo ato moral da proposta aristotélica, cuja tarefa da filosofia prática é ensinar a "agir bem" e tornar os homens bons e virtuosos e, consequentemente,verdadeiros cidadãos.
    Educação moral: a busca da excelência a partir de virtudes aristotélicas e a formação do educador, escrito por Talita Carneiro Gader Safa e Samuel Mendonça, coloca em relevo a necessidade do cultivo de virtudes para a construção da excelência moral do homem. Se a educação moral exerce algum papel na formação da personalidade humana, então é preciso examinar que virtudes são efetivamente necessárias para o  desenvolvimento do caráter do homem. Os autores defendem que a educação moral, tal como a temos concebido, possibilita a construção da autonomia do educando, para que ele se torne um cidadão emancipado, independente, crítico e, antes, autocrítico. O objetivo principal é compreender a excelência humana a partir do  desenvolvimento de virtudes aristotélicas, especialmente a justiça e a amizade, com vistas aos desafios que se colocam aos educadores.
    O estudo Ética da libertação de Enrique Dussel: caminho de superação do irracionalismo moderno e da exclusão social, de Ivanilde Apoluceno Oliveira e Alder Sousa Dias, reflete sobre a relação entre o eu e o outro no campo social, debatendo a questão da exclusão social. A partir da ética dusseliana, analisam criticamente o discurso eurocêntrico moderno e a possibilidade de superação do irracionalismo moderno por meio da razão críticolibertadora.
    O texto seguinte, Pensando a ética na perspectiva das formas simbólicas de Ernst Cassirer, de Vladimir Fernandes, analisa se a denominada "ampliação" que Cassirer realizou da epistemologia kantiana pode ser estendida à esfera moral, ou seja, se há um paralelo entre o problema epistemológico e a moral em Kant, e se Cassirer explora o problema epistemológico por outra perspectiva.
    Ciência e ética: uma nova formulação do imperativo categórico como princípio da responsabilidade em Hans Jonas é um texto de Antônio Carlos de Souza, Fábio Antônio Gabriel e Odirlei Silva de Souza no qual os autores fazem uma análise epistemológica e observam as principais causas, os fatores e motivos que levaram o Planeta ao desequilíbrio ecológico e social. Para reverter esse cenário de grande destruição, de questionamentos e incertezas, analisam a ética de Hans Jonas como substituta de todo o arcabouço conceitual da ética tradicional e postuladora de novos valores e conceitos.
    tamar Soares Veiga é o autor do último texto: Sobre a distinção argumentativa entre a área da lógica e a ética. É uma investigação que trata das diferenças entre a lógica e a ética. Para tal, o investigador inicialmente comparou cada área às ciências e buscou o processo argumentativo como um fator principal de diferenciação. Isso se expressa mais diretamente no problema de pesquisa, que visa a investigar se as diferentes áreas filosóficas também possuem diferentes processos de argumentação. A relevância do texto se encontra na identificação de determinadas tem-ses entre as áreas filosóficas. O resultado mostra que os diferentes conteúdos tratados por distintas áreas filosóficas exercem um efeito importante sobre os processos argumentativos.
    Completam este número a resenha de Paulo Tiago Cardoso Campos da obra Estudo de caso: uma estratégia de pesquisa, de Gilberto de Andrade Martins, e a resenha de Juliane Scariot da obra História da ética, de Henry Sidgwick.

     

    Everaldo Cescon
    Organizador

  • Vol. 17 No. 2

    Apresentação


    A condição de imanência no tempo desafia-nos a sermos gestores de nossa existência, de nosso mundo individual e coletivo. Sabemos que a especificidade do humano só pode ser captada na apreensão das mediações nas quais nossa existência se plasma. Daí o interesse pela práxis, isto é, nosso processo de mediações com a natureza, com a sociedade e com a cultura, com as quais nos constituímos como seres humanos. Quer dizer, o interesse pela história da educação decorre da pergunta pela nossa historicidade, tentando desvendar os caminhos e processos pelos quais nos tornamos o que somos. O presente número da revista Conjetura contempla textos que enfocam aspectos da história da educação. Na organização do mesmo, não houve o objetivo de formar um número temático. E como o leitor estará observando, os textos apresentados pelos autores são relativos a diversas manifestações de práticas educacionais na história da educação. No seu conjunto, revelam facetas da multiplicidade de iniciativas e da criatividade humana no ato de pensar e praticar o processo escolar referente aos séculos XIX e XX. A ordem dos textos segue a sequência cronológica das práticas educacionais explicitadas nos mesmos. Convidamos para a leitura das narrativas apresentadas pelos diversos autores com o sentimento de que será um momento de leitura e reflexão interessante a respeito de algumas práticas educacionais em nosso processo escolar que, certamente, interferiram na constituição de nossa prática atual, entendendo-a em sua historicidade e nos motivando a repensá-la constantemente.

    Em Práticas de castigos escolares: enlaces históricos entre normas e cotidiano, Milena Aragão e Anamaria Gonçalves Bueno de Freitas tratam, em texto muito instigante, da questão do castigo nas escolas, nos séculos XIX e XX. Enfatizam as estratégias das instâncias de poder na ordenação dessas práticas e as táticas para lidar com as normatizações na dinâmica diária do processo escolar por parte de gestores e professores. No século XIX, os professores recorriam a férulas, chicotes e palmatórias para manter a ordem e a disciplina. Essa violência não ocorria somente nas escolas, estava presente também nas relações humanas do período, retratando uma sociedade impregnada de práticas violentas. Diversas fontes sinalizam para casos de oposição a essas práticas e também revelam casos de professores que solicitavam a autorização dos pais para o uso das mesmas. Em algumas unidades da Federação, foi possível constatar que pais retiraram seus filhos de escolas públicas, sem castigos físicos, matriculando-os em escolas particulares nas quais esse hábito ainda era admitido. As autoras ressaltam que a questão dos castigos físicos não estava restrita ao universo escolar, pois a cultura de violência permeava a sociedade como um todo. Ao longo do século XX, ocorreu um gradativo avanço das posições contra a violência escolar na formação docente e diversos órgãos de proteção da infância foram criados, como a Diretoria de Proteção à Maternidade e à Infância (1934), o Serviço de Assistência ao Menor (1941) e a Fundação Nacional para o Bem-Estar do Menor (Funabem) (1964).

    Eduardo Arriada, Gabriela Medeiros Nogueira e Mônica Maciel Vahl apresentam resultados de pesquisa sobre a utilização do espaço escolar no século XIX. Enfocam principalmente a sala de aula, entendida como o lugar onde "as relações de dominação, controle e disciplina instituem um modelo de educação". A partir de fontes de pesquisa, como memórias de estudantes, ofícios de professores, programas de escolas, relatórios da instrução pública, imagens iconográficas, examinam as relações de poder engendradas no espaço da sala de aula, entendendo-as como relações permeadas de conflitos e sujeições. O espaço da sala de aula, considerado espaço por excelência de convívio escolar, retrata uma disputa de poder sob a presença constante do professor que procura impor uma relação de disciplina, regularidade de ações e comportamentos, em etapas bem-delimitadas. Os autores surpreendem o leitor com  as conexões que percebem na variada materialidade escolar - como sala de aula, mobília, livros, etc. - com esse referencial de disciplinamento presente nas ações e nos simbolismos da atividade escolar.

    No texto A perfeição humana na perspectiva católica de D. João Becker no período de 1912 a 1946, Cláudia Regina Costa Pacheco, Elomar Antonio Calegaro Tambara e Jorge Luiz da Cunha examinam a contribuição desse arcebispo de Porto Alegre para a constituição de um ideal humano tendo a educação como principal mecanismo para a sua efetivação. Os autores realizaram uma pesquisa bibliográfica, promovendo a análise da documentação histórica referente ao acervo da revista Unitas, fundada por esse arcebispo para ser o instrumento oficial de comunicação da arquidiocese. Concluem que a arquidiocese, sob a liderança de D. João Becker, ditava Conjectura, v. 17, n. 2, maio/ago. 2012 11 diretrizes para a educação, pois considerava sua principal função ensinar "a verdade" católica, tida como referência para redimir a humanidade doentia. Por isso, na Unitas, apresentava-se a Igreja como organizadora da sociedade humana, buscando reforçar o crucial papel da juventude, considerando a família como ambiente natural da e necessário à educação. E a escola era concebida como espaço complementar para a família e a Igreja, devendo harmonizar-se com os ensinamentos dessas duas instituições. Segundo as diretrizes de D. João Becker, a educação cristã era superior a qualquer método pedagógico moderno. Esses eram considerados imperfeitos e prejudiciais se não estivessem de acordo com a moral cristã. Por isso, a educação cristã dos jovens, iniciada ainda no seio materno,  com o auxílio da Igreja, seria complementada no âmbito escolar em harmonia com os mesmos princípios. No período em questão, a normatização da Igreja Católica para a educação foi marcante para a região de abrangência da arquidiocese, considerando-se sua rede de instituições e sua influência na sociedade de então.

    Álbuns confeccionados pelas professoras do primeiro ano primário do Colégio Farroupilha (Porto Alegre/RS), de 1948 a 1966, com fotografias das turmas e as cartinhas de cada aluno, acompanhadas por fotografias individuais,  constituíram o objeto de estudo cujo resultado sua autora, Maria Helena Câmara Bastos, apresenta em seu texto. Ela considera que os álbuns e, especialmente, as cartinhas constituem um expressivo corpus documental do cotidiano da escola e das práticas educativas. Essa prática ocorreu ao longo do primeiro ano, quando se efetivava o processo de alfabetização, expressando toda uma rede paralela de significações. Maria Helena centrou-se no exame da  materialidade desse acervo e analisou a prática de escritas escolares infantis, objetivando perceber os mecanismos de continuidade e descontinuidade presentes no trabalho pedagógico. A pesquisa detém-se no exame da  materialidade do conjunto de 34 álbuns do memorial e analisa as práticas de escritas escolares infantis a partir da escrita epistolar. Examina o que os alunos escrevem, como se apresentam à diretora, pergunta-se por diferenças de gênero entre as escritas infantis e também enfoca a caligrafia e a correção da ortografia. Busca, ainda, perceber os mecanismos de continuidade e descontinuidade presentes no trabalho pedagógico de alfabetização. A autora salienta a importância da infância e da instituição escolar na construção social da memória e o interesse histórico de ver traços de tempos passados mostrando que as memórias de vida ou as escritas ordinárias são testemunhos preciosos da cultura escolar de um tempo e de um espaço significativos para a construção da história da escola e da educação.

    No artigo Memórias de docentes: narrativas sobre saberes e fazeres de duas professoras rurais de Caxias do Sul/RS (1920-1950) são privilegiadas as memórias das professoras Alice Gasperin e Irides Lourdes Rech. Elas foram docentes rurais que atuaram em Caxias do Sul, no período de 1920 a 1950. Gelson Leonardo Rech, Lúcio Kreutze e Terciane Ângela Luchese, autores do texto, procuram entretecer a história da educação desse município a partir das histórias ordinárias de vida dessas professoras. Entendem que o relato da experiência delas permite compreender os cenários escolares rurais: os saberes ensinados, os fazeres cotidianos, as dificuldades para frequentar a escola, para se tornarem e, mesmo, para se manterem professoras. Os autores do texto não se preocuparam em trazer relatos de professoras que tivessem o mesmo perfil ou vivido no mesmo momento histórico, mas enfatizar diferenças,  trajetórias e experiências múltiplas que, no entanto, convergem em diversos aspectos, quais sejam: ambas foram professoras rurais em Caxias do Sul, tendo iniciado a carreira como leigas. Alice permaneceu como professora por mais de quatro décadas, tendo buscado formação. Irides, tendo cursado os quatro anos do então Curso Primário, lecionou de forma voluntária aos que não se aproximavam da escola quer por a negligenciarem, quer em virtude da  opção preferencial pelo trabalho, marca remanescente dos primeiros imigrantes. Após alguns anos de atuação, foi impelida pelas condições da própria família, a desistir da docência. O texto remete a essas peculiaridades. Curiosamente, a experiência de Irides ocorreu na segunda metade da década de 40 (séc. XX), quando Caxias do Sul já contava com uma centena de escolas municipais e em torno de 120 professores, sendo que, em Fazenda Souza,  onde morava, havia várias escolas municipais, duas escolas particulares e uma escola estadual. No entanto, alunos ainda frequentavam aulas particulares dadas por professores de ofício ou simplesmente um pouco mais  instruídos. As famílias buscavam resolver a questão da educação informalmente, a seu jeito. Entendiam a importância da alfabetização dos filhos, no entanto, em alguns casos, encaminhavamnos por meios menos ortodoxos. No  texto também fica claro que a concepção de magistério dessas duas professoras retrata seu comprometimento com a comunidade, em suas múltiplas funções. De outra parte, percebe-se o reconhecimento simbólico do fazer docente  nas comunidades rurais caxienses.

    Doris Bittencourt Almeida investigou a revista O Clarim, produzida pelos alunos do Colégio Farroupilha, em Porto Alegre/RS, entre os anos de 1945 e 1965. No texto Um periódico juvenil: civilidades nas páginas de O Clarim  percebe-se que esse periódico constitui-se em rica fonte para a história da educação por revelar representações da cultura juvenil daquele tempo. No texto de Doris, interessam os significados dos discursos difundidos pelo periódico,  nos processos de subjetivação provocados pelos textos e suas possíveis influências na construção da identidade daqueles jovens. A pesquisa identifica-se com os pressupostos teóricos da história cultural e se inscreve no campo das  práticas de leitura e escrita e de memórias juvenis, tendo como referenciais as concepções de cultura escrita como uma produção discursiva de um determinado tempo e lugar. Os periódicos estudantis constituem-se em um  mportante veículo educativo para seus leitores e revelam um pouco da história das instituições educativas. Além disso, traduzem aspectos significativos do cotidiano escolar e mostram indícios de saberes e de práticas escolares  identificadas com preceitos de civilidade. Ao longo das páginas das revistas, vai sendo explicitado um modelo de aluno que precisa desenvolver autocontrole e autorregulação, que deve acreditar em determinados conceitos, desenvolver certas atitudes e não outras, enfim, deve civilizar-se e priorizar o estudo em sua vida para alcançar um padrão de comportamento desejado pelo mundo dos adultos.

    Beatriz T. Daudt Fischer e Marcos Fontana Cerutti pesquisaram a Comissão Especial de Investigação Sumária (Ceis), instalada na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) logo após o golpe civil-militar/ 1964, que teve como objetivo investigar ações consideradas subversivas, envolvendo professores, funcionários e estudantes. Os autores do texto Comissão Especial de Investigação Sumária: uma estratégia política nada sutil (Brasil, golpe civil-militar/1964) buscaram saber como tal acontecimento é hoje relembrado por alguns estudantes da época, diretamente envolvidos naquele contexto. Para busca de dados, optaram pela história oral, coletando narrativas de cinco sujeitos, além de pesquisa documental: atas, fichas de informações, ofícios e matérias do jornal Correio  do Povo. No texto, acerca daquele contexto, apresentam detalhes significativos sobre o funcionamento da referida comissão. O conjunto de dados coletados serve como pano de fundo para melhor compreender a época, facilitando a  busca por sujeitos, então estudantes, que agora disponibilizam algumas horas de seu cotidiano para, através da memória, rememorar tal acontecimento. A análise desses documentos revela que existiu uma cooperação entre os  órgãos de repressão no que se refere à troca de informações. Analisando o depoimento dos sujeitos, constata-se que o movimento estudantil não restringiu sua participação e ação às questões acadêmicas, pelo contrário, os  estudantes tinham um forte vínculo com as demais questões políticas da sociedade. Outro aspecto que chamou muito a atenção nas cinco entrevistas analisadas foi o forte vínculo do movimento estudantil com os movimentos sociais. Os anos 60 do século XX marcaram a intensa atuação de diversos movimentos sociais organizados, tanto de esquerda quanto de direita, como os sindicatos, as ligas camponesas, o próprio movimento estudantil, os movimentos de  alfabetização de jovens e adultos, principalmente através do método de Paulo Freire, de movimentos ligados à Igreja Católica e de partidos políticos, que foram reprimidos pela ditadura militar. Os cincos sujeitos da pesquisa tinham  ligação com o movimento estudantil.

    Giana Lange do Amaral e Josiane Alves da Silveira no artigo Os bastidores de uma pesquisa em história da educação: a Faculdade Católica de Filosofia de Rio Grande/RS destacam as escolhas e os caminhos da produção de uma pesquisa histórica sobre a Faculdade Católica de Filosofia de Rio Grande. O texto centra-se na fundamentação teórico-epistemológica da pesquisa. Para compreender as diferentes fases do trabalho com História Oral recorreram,  principalmente, a Alberti (1989, 2005) e Ferreira e Amado (1998). Já para o embasamento da memória buscaram apoio em estudo de Bosi (1994, 2003), Catroga (2001) e Halbwachs (2004). Apostam na diversificação das fontes de  esquisa, tendo como base os estudos de Pesavento (1995, 2004, 2008) e Burke (2005) sobre os caminhos abertos pela História Cultural. Já para a utilização de fontes escritas, os documentos institucionais e os jornais recorreram a  Luca (2005), Ragazzini (2001) e Veyne (1987). O texto compreende uma cuidadosa tentativa de fundamentação teórico-epistemológica de pesquisa realizada na perspectiva da História Cultural. Por isso, se restringe aos bastidores  da pesquisa e apresenta uma contribuição importante sob esse aspecto.

    No fim são publicadas duas resenhas que privilegiam diferentes vieses. A leitura do livro Justiça: o que é fazer a coisa certa, de Michael Sandel produzida por Alessandra Bombassaro, nos apresenta uma obra de filosofia política. Resultado de aulas ministradas como professor em Harvard, ao longo dos dez capítulos, Sandel, crítico do liberalismo, trata de temas diversos e contemporâneos,  tais como: a filosofia do livre mercado, o socorro financeiro aos bancos, a bioética, o suicídio assistido, o direito ao aborto, dentre outros.

    A resenha de Diogo da Silva Roiz, do livro Secularização inacabada:política e direito em Carl Schmitt escrito por Pedro H. V. B. Castelo Branco, retrata como Carl Schmitt "apreendia a questão da lei e da decisão, qual a epresentatividade do Estado e qual a função da secularização nos processos de formação de suas estruturas institucionais, e em que medida a secularização do conceito de político agiria em prol desse processo".

    No conjunto de  textos publicados nesta edição, evidencia-se a pluralidade de perspectivas, temas, documentos e possibilidades investigativas que têm sido pesquisados pela comunidade de pesquisadores de História da Educação. Desejamos que os  artigos destaedição possibilitem discussões, viabilizem novas investigações e frutifiquem em nossos espaços de estudo e trabalho.
    Boa leitura!

    Lúcio Kreutz
    Terciane Ângela Luchese
    Organizadores
  • Vol. 17 No. 1

    Conjectura, Volume 17, Número 1, Jan./ Abril. 2012
    Tema: Ética
    Ano: 2012
  • Vol. 16 No. 1

    Apresentação

    Que no nosso País haja um défice de cultura ética, está amplamente demonstrado pela observação direta dos fatos macroscópicos de corrupção política e econômica que atacam não só a elite que está no poder, mas também as pessoas comuns, sobretudo - e não só - em relação a fenômenos como a evasão fiscal, a ponto de levar algum intelectual à amarga constatação de que a ética está morta. Há um sistema de corrupção difundida que ataca toda a sociedade e envolve, de diversos modos, todos os cidadãos. Há problemas de superfície, mas que remetem a mudanças mais profundas.

    Fica a convicção de que as raízes dos nossos problemas sociais e políticos são muito antigas. Evidentemente, com isso não se pretende absolver as nossas responsabilidades, mas buscar as razões mais profundas. Há um sistema subterrâneo de corrupção que ataca toda a sociedade e envolve, de diversas formas, cada cidadão. O fenômeno das favelas, portanto, não é somente um problema social, mas sobretudo uma questão moral que revela a deterioração da moralidade pública e a falta de sentido do Estado e da comunidade.

    Assim, o presente número da revista Conjectura apresenta contribuições de diversos pesquisadores em torno da Ética.

    O texto de abertura é do professor Cristoph Horn e procura traçar a diferença entre a filosofia moral antiga e a filosofia moral moderna. Segundo o autor, os antigos queriam saber a resposta à pergunta segundo a vida boa. Eles queriam saber a razão/motivo de condução da vida humana para o bom resultado ou para o fracasso e assim conduzir a práxis individual. De outro modo mostra-se a filosofia moral moderna que prioriza o interesse nos princípios e nos problemas de fundamentação moral, nos casos de conflitos políticos relevantes e nos campos de aplicação social precários. O acento da filosofia moral antiga está centrado no agente (agent-centered), enquanto que na filosofia moral moderna, no ato (act-centered). Central para os antigos estava a qualidade moral da pessoa agente, central para os modernos é a pergunta acerca do valor moral das ações de acordo com sua ligação e fundamentos para isso.

    Em seu texto, Jesús Arraiza defende a hipótese de que, segundo Aristóteles, a vida contemplativa consiste no ato do intelecto e no ato da percepção sensorial. Segundo sua interpretação, a felicidade aristotélica, no sentido de felicidade contemplativa, consiste portanto numa atividade que somente é possível durante a vigília, quando não nos encontramos tomados em qualquer dos apetites e paixões que obstaculizam nosso contato com nossa realidade interna ou externa. Alcançar a contemplação neste sentido é algo como perceber que vemos quando vemos, perceber que escutamos quando escutamos, perceber que pensamos quando pensamos, e perceber que existimos quando percebemos que percebemos e que pensamos. E tanto mais felizes seremos, de acordo com sua interpretação, quanto mais capazes formos ao longo da nossa vida de pôr em ato esta faculdade sensorial em relação a nossos próprios sentidos e intelecto.

    Marly Carvalho Soares expõe o Direito Abstrato da Filosofia do Direito de Hegel com destaque ao direito de ter nas suas explicitações: a personalidade, a possessão, a propriedade, o contrato, a injustiça e a violência. A argumentação de Hegel consiste em criar as condições necessárias para que uma vida seja livre. Um miserável não pode ser livre, pois segundo Hegel o direito de ter é um direito universal e não somente de alguns particulares. Desse modo o Direito, para Hegel, é a ideia da efetivação da liberdade que compreende o direito de ter, o direito de ser livre e o direito de ter e ser livre. A professora da UECE justifica sua análise a partir da constatação de que, na atualidade, o direito de ter, numa sociedade moralmente antagônica, não é cumprido.

    Supondo que a experiência do nós ético-histórico, a comunidade, o povo, forma parte da idiossincrasia cultural de nossa América, o professor Juan Carlos Scannone procura situar uma ética inculturada a partir da perspectiva latino-americana. Trata do próprio conceito do nós ético-histórico e de sua eticidade. Aborda a compreensão do "nós" e, a seguir, a racionalidade ética que corresponde a tal compreensão.

    Analisar o pensamento estético de Platão e sua relação com a formação do homem, mostrando que sua concepção estética vai muito além da esfera da arte é o objetivo de Juan Carlos Mansur. Procura mostrar que em Platão, enquanto amante da beleza, a reflexão estética transita na esfera da moral, da ciência e da metafísica, não sendo, por conseguinte, o atributo estético da beleza campo exclusivo da arte. Ou seja, a beleza permeia toda a filosofia de Platão desde sua metafísica e cosmologia, passando por sua filosofia da natureza, até chegar a todas as atividades humanas, tais como, a ciência, a política, a ética.

    A crítica da verdade tem sido tônica do pensamento de muitos autores da contemporaneidade. Destes, Sandro Cozza Sayão destaca a obra do filósofo lituano/francês Emmanuel Levinas em sua crítica à ontologia e na defesa da exterioridade como alteridade. Em seu escopo o artigo que apresentamos traça uma análise da precariedade e finitude de nossos ditos, assim como da impossibilidade destes darem conta da dimensão maior do dizer da vida. A idéia é dar ênfase à precariedade, à complexidade e à imponderabilidade de nossos discursos e nossos saberes.

    Sofia Miguens, professora de filosofia na Universidade do Porto, procura descrever a posição da filósofa norte-americana Cora Diamond acerca da natureza do pensamento moral e do que pensamos que fazemos quando fazemos filosofia moral. Por trás da análise do papel da imaginação moral em ética está a questão mais geral da natureza do método filosófico. Cora Diamond, uma especialista de Frege e Wittgenstein, que os lê dando especial atenção à filosofia da linguagem, do pensamento, da lógica e da matemática, é fortemente crítica de uma certa forma de conceber a natureza da filosofia moral, muito comum hoje entre os filósofos analíticos, como exclusivamente centrada na ação e na decisão de agentes e em argumentos acerca daquilo que é racional fazer. Foi essa crítica, que podemos considerar feita de um ponto de vista metodológico, que fez Cora Diamond entrar em polêmica, há cerca de trinta anos atrás, com autores muito influentes em ética como Peter Singer e Tom Regan, mesmo se partilha com eles muitas intuições.

    Paulo César Nodari e Fernando Saugo abordam os conceitos de esclarecimento, educação e autonomia na concepção do filósofo Immanuel Kant. Para tanto, analisam o conceito esclarecimento, a fim de compreender de que modo, em Kant, se dá a passagem do homem de seu estado de menoridade à maioridade. Também procuram evidenciar a tese kantiana de que a emancipação do homem não se dá sem a educação. E, por fim, à luz da análise feita dos dois conceitos-base deste trabalho monográfico, esclarecimento e educação, investigam a conexão entre ambos, procurando sustentar a tese de que esclarecimento e educação estão conectados com a autonomia moral.

    Elnora Gondin e Osvaldino Marra Rodrigues pretendem demonstrar que a posição original, em John Rawls, é um recurso heurístico para pensar as questões de justiça. A posição original é um procedimento que faz parte das condições de elegibilidade dos princípios de justiça. Esse artifício é definido como procedimentalismo puro; aquele onde os procedimentos justos garantem os resultados justos.

    Resta-nos, por fim, desejar uma ótima leitura a todos!

     

    Paulo César Nodari e Everaldo Cescon

    Os Organizadores.

     

  • Vol. 15 No. 3

    Apresentação

    "As coisas da educação discutem-se, quase sempre,

    a partir das mesmas dicotomias, das mesmas oposições, dos mesmos

    argumentos. Anos e anos a fio. Banalidades.

    Palavras gastas. Irritantemente óbvias, mas sempre repetidas como se

    fossem novidade. Uns anunciam o paraíso,

    outros o caos - a educação das novas gerações

    é sempre pior do que a nossa. Será?"

    (NÓVOA, Antônio)

     

     

    A epígrafe de abertura, escrita por Nóvoa, é uma provocação para pesquisadores e todos os envolvidos com a educação do presente. Escrevemos, pesquisamos, discutimos e trazemos a lume, nos diferentes contextos, as questões educativas do hoje. A partir de que pressupostos? Com quais embasamentos? Com que referências e subsídios? E, nesse direcionamento, outra questão é pertinente: Como a História da Educação pode nos subsidiar reflexões mais relevantes sobre esses cenários contemporâneos? Pensando-se nas conexões entre os desafios da educação contemporânea e as contribuições das pesquisas produzidas na área de História da Educação, é com alegria que apresentamos a Revista Conjectura em seu último número de 2010 tendo como foco temático a(s) "História(s) da Educação". Publicamos 11 artigos que trazem diferentes abordagens e temas para pensarmos a educação, historicamente, em suas múltiplas possibilidades. A leitura dos processos educativos humanos, em diferentes tempos, nos permite compreender as discussões produzidas no presente sobre a educação.

    Considerando as interfaces com o político, o social, o econômico e o cultural para pensar a educação, as pesquisas em História da Educação têm propiciado o entendimento da pluralidade de práticas educativas. Também a compreensão de quem são os sujeitos escolares envolvidos, quais foram os projetos, leis e regulamentos discutidos e pouco efetivados, os tempos e espaços escolares, a educação formal e a não formal, a dinâmica dos processos que educam, socializam e constituem os homens ao longo do tempo, numa diversidade de enfoques teóricos e metodológicos.

    O primeiro artigo intitulado "Educação Infantil e ensino intuitivo: a contribuição de Marie Pape-Carpantier (1815-1878)" de autoria de Maria Helena Camara Bastos reconstrói a trajetória da educadora Marie Pape- Carpantier, estabelecendo as relações com a adoção do método intuitivo para a educação dos sentidos - lições de coisas -, na proposta pedagógica destinada à Educação Infantil, na criação de materiais didáticos para auxiliar no desenvolvimento do método natural e na orientação de modelos de mobílias para as escolas.

    O segundo texto de Suad Aparecida Ribeiro de Oliveira também tem como foco a infância. Em "A história do primeiro parque infantil municipal de Sorocaba: o contexto histórico e as circunstâncias específicas da criação e da instalação da escola", a autora apresenta um breve histórico das primeiras instituições de atendimento infantil no Brasil e na cidade de São Paulo, para, posteriormente, escrever sobre o primeiro parque infantil inaugurado em setembro de 1954, em Sorocaba. O trabalho feminino, a atuação de professores como José Carlos de Almeida e o atendimento de pré-escolares por meio da expansão das políticas públicas ficam evidenciados no texto.

    O terceiro artigo, "Civismo e militarização da infância: uma abordagem baseada no jornal O Rebate (Pelotas/RS, 1914-1915)", de autoria de Maria Augusta Martiarena de Oliveira e Giana Lange do Amaral, privilegiando como fonte documental o jornal O Rebate, periódico de oposição ao Partido Republicano Rio-Grandense, apresenta uma análise sobre as festas cívicas e a educação cívica no período da Primeira República.

    O quarto artigo, "ELA: uma contribuição da cultura escolar para a formação inicial", de autoria de Leia Adriana da Silva Santiago produz, na perspectiva da história das disciplinas escolares, a análise do processo de constituição da disciplina de Estudos Latino-Americanos no âmbito do Colégio de Aplicação da Universidade Federal de Santa Catarina.

    O quinto texto, dos pesquisadores Muleka Mwewa, Ana Inés Renta e Abudo Machud, intitulado "Alguns aspectos sobre a educação de adultos na Europa", privilegia a investigação de alguns aspectos da estrutura organizativa e dos mecanismos teórico-metodológicos para a gestão da formação de adultos na Europa.

    O sexto texto, "Do ambiente doméstico às salas de aula: novos espaços, velhas representações" traz a lume a pesquisa de Milena Aragão e Lúcio Kreutz que enfocam as representações construídas acerca da mulher professora no processo de feminização do magistério e suas possíveis repercussões nas práticas pedagógicas.

    O sétimo artigo, de autoria de Roseli Maria Bergozza e Terciane Ângela Luchese, "Escola Complementar: primeira escola pública para formação de professores primários na cidade de Caxias do Sul - 1930-1961", privilegia esse período, estudando a Escola Complementar na perspectiva da cultura escolar. São evidenciados, no texto, os temas de nacionalização do ensino, a feminização do magistério e os discursos médicos que atravessaram as práticas daquela instituição de ensino.

    O oitavo texto, "A performance do professor coordenador na escola burguesa", dos pesquisadores Marcia Natália Motta Mello e José Luis Almeida discute, a partir da escola pública paulista, a atividade do professor coordenador em interface com as expectativas do ideário neoliberal.

    O nono artigo intitulado "A educação a distância na sociedade da informação: uma análise histórica da Educação Superior a Distância na formação de gestores públicos no cenário brasileiro", da autora Rejane Esther Vieira versa sobre a educação a distância na sociedade da informação e destaca o novo enfoque da Educação Superior a Distância voltada à formação de gestores públicos no cenário brasileiro.

    O décimo artigo, "Caminhares: fragmentos sobre oficinas de escrita e interrogações sobre os ensinares e os aprenderes", de Mariana De Bastiani Lange, compartilha fragmentos da experiência com Oficina de Escrita, preocupando-se com questões de endereçamento implicadas nos processos de escrita e aprendizagem.

    O último artigo, "Ecos de um cotidiano juvenil: as escritas de si na privação da liberdade", de autoria das pesquisadoras Nilda Stecanela e Carmem Craidy, destaca, a partir de narrativas escritas por jovens em privação de liberdade, a temática do cotidiano juvenil. Aspectos como liberdade, situação juvenil e realidades vividas nos espaços de restrição de liberdade são enfocados.

    No fim são publicadas quatro resenhas que privilegiam questões educacionais em diferentes vieses. A primeira, de Claudia Luci Scussel, "Professoras primárias e seus papéis no palco da vida" enfoca o livro de Beatriz Daudt Fischer, Professoras: histórias e percursos de um passado presente. A segunda resenha elaborada por Andreza Marques de Castro Leão traz a abordagem da obra do escritor português José Saramago, A Caverna. A terceira, de Andréia Bonho Borba, enfoca a obra de Walter Omar Kohan intitulada Filosofia: o paradoxo de aprender e ensinar. Por fim, Eli Narciso da Silva Torres traz apontamentos acerca da obra coletiva O legado educacional do século XX no Brasil.
    Do conjunto de textos publicados nesta edição evidencia-se a pluralidadede perspectivas, temas, documentos e possibilidades investigativas que têm sido pesquisados pela comunidade de pesquisadores de História da Educação. Desejamos que as pesquisas publicadas nesta edição possibilitem discussões, viabilizem novas investigações e frutifiquem em nossos espaços de estudo e trabalho.

    Boa leitura!

    Terciane Ângela Luchese

    Organizadora

  • Vol. 15 No. 2

         Observando nosso entorno, não há como negar que as Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) estão mudando nossa vida, nossos hábitos e nossa maneira de conviver, uma vez que elas proporcionam diversas formas de acesso, armazenamento e aquisição de informação, bem como formas alternativas para a comunicação.
         Considerando a educação como agente que pode e deve impulsionar transformações no sentido de promover a formação de indivíduos criativos e empreendedores, capazes de despertar o mundo para uma consciência global e sistêmica, pensarmos a relação entre educação e as TICs é um desafio relevante para que a inserção das TICs, em processos educativos, traga consigo um repensar das práticas pedagógicas, fazendo surgir formas inovadoras para essas práticas. Por exemplo, se refletirmos sobre a forma como a internet acolhe blogs, orkuts, MSN e outros recursos de comunicação e a forma como os nossos jovens "nativos digitais" os utilizam para se comunicar e trocar ideias, podemos pensar em derivar daí possibilidades de utilizar esses recursos para mediar o diálogo pedagógico e repensar a forma como temos planejado nosso fazer docente. Esses recursos podem ser configurados para constituir ambientes de aprendizagem, "locais simulados", na web, que servem de mediação ou suporte para o
    desenvolvimento de processos educativos. Podem ser entendidos como "cenários onde as pessoas interagem", mediadas pela linguagem suportada pela interface gráfica/digital, podendo fazer surgir um espaço onde os interagentes se constroem como elementos ativos,  coautores do processo de aprendizagem.
         A partir dessa forma de pensar as TICs, como recursos pedagógicos, as concepções tradicionais de ensino e aprendizagem podem ser redimensionadas. Isso já está acontecendo, fazendo surgir novos perfis de professor e de estudante. No caso do professor, ele surge como problematizador (formulando questões, problemas, provocando interrogações); promovendo interações que favoreçam o diálogo e as cooperações; suscitando a expressão e a confrontação; sistematizando as experiências/colaborações dos estudantes em coautoria com eles, intervindo de forma cooperativa. Nesse cenário, o estudante aparece como um agente ativo, participativo, comprometido e envolvido.
         Sob essa forma de abordar as TICs nos processos educativos, a ação do professor, que atua na rede de convivência e de interação que será desenvolvida, a partir de ações conjuntas dele próprio e dos estudantes, pode ser melhor entendida pela expressão "gestão pedagógica", uma vezque o foco do processo educativo ultrapassa o discurso  do professor. A gestão pedagógica, sob essa ótica, é uma administração do ambiente de aprendizagem, em termos de criação de estratégias, intervenções, orientações e processos de avaliação, a partir da observação do fluxo das interações.
         Pensadas a partir dessa perspectiva, as chamadas TICs apresentam possibilidades para a mediação do processo educativo, podendo trazer consigo mudanças que vão muito além de aspectos técnicos, pedagógicos e administrativos. Nesse sentido, é importante destacar que o uso das tecnologias precisa trazer consigo um repensar e um redimensionar das ações educativas, para que seu uso, na educação, ultrapasse o simples repassar de informações e se constitua numa possibilidade de emergência de contextos de aprendizagem, baseados em construção,  interação e colaboração. Vale ressaltar que essas tecnologias farão surgir o que os sujeitos agentes definirão, pois elas apenas fazem fluir aquilo que nós, os sujeitos na ação, vamos pensar, planejar, decidir. Nesse viés, o que faremos com as tecnologias será definido pela nossa ação, que, por sua vez, reflete nossa visão de mundo.
         A fim de avançar nessa reflexão e construção de inovação no contexto das TICs e educação, pesquisadores e estudiosos do tema oferecem suas produções, neste número da Revista Conjectura que foi dedicado ao tema.
         Assim, apresentamos 11 artigos e quatro resenhas para discussões e reflexões em torno do tema, na intenção de que possamos contribuir para o avanço dos estudos, das produções e intervenções no contexto dos processos educativos mediados pelas TICs.
         O primeiro artigo é de autoria de Adriano Rodrigues Ruiz, com o título "A reconstrução das práticas educativas e a arte de escolher". Nele o autor aborda aspectos que ganharam relevância, com o advento das tecnologias, nos processos educacionais, tais como, o apreço à autoria; a autonomia para aprender; e o cuidado com a disciplina intelectual, referindose, ainda, à importância da reconstrução das práticas educativas.
        No segundo artigo, Ana Cláudia Cerini Trevisan, Gabriela Spagnuolo Cavicchioli, Mariana Sieni da Cruz Gallo e Doralice Aparecida Paranzini Gorni apresentam o texto intitulado "TV Pendrive: o que dizem os professores", no qual discutem as relações existentes entre mídia e educação, analisando as políticas públicas que influenciaram a criação da TV Pendrive, identificando a percepção dos professores acerca da mesma.
         O terceiro artigo, cujo título é "Ciborgues, robôs e clones na pedagogia do cinema", de Angela Dillmann Nunes Bicca e Maria Lúcia Castagana Wortmann, apresenta discussões a partir de alguns filmes classificados como de ficção científica, mostrando como o cinema nos tem ensinado a ver e a viver nessa civilização altamente tecnológica. Muitos dos debates conduzidos salientam a centralidade que as TICs alcançam nas sociedades contemporâneas, convidando o leitor a pensar como isso pode ser refletido
    ou aproveitado nos processos educativos.
         O quarto artigo, dos autores César Fernando Meurer, Neusa Maria John Scheid e Cledes Antonio Casagrande, com o título "Aprendizagem no ciberespaço", parte de interrogações de índole epistemológica, caracterizandoa hipermídia como a linguagem do ciberespaço e identificando diferentes perfis de leitores de hipermídia, para apresentar considerações em torno de dois aspectos: as tecnologias digitais, que possuem potencial para amplificar a aprendizagem; e as tecnologias digitais, que não minimizam a importância da mediação docente na forma escolar de aprendizagem.
         No quinto artigo, Diego Chiapinotto apresenta o texto intitulado "Linguagem, educação e TICs", discutindo as relações entre linguagem, educação e TICs a partir da teoria do interacionismo sociodiscursivo.
         No sexto artigo intitulado "Interação mediada por computador: hipermídia educacional nas atividades de estudo a distância", Fabiane Sarmento Oliveira Fruet e Fábio da Purificação de Bastos apresentam estudos problematizando a integração da hipermídia educacional, nas atividades de estudo a distância como possibilidade de potencializar a interação mediada por computador.
         No sétimo artigo, denominado "A cultura emergente na convivência em MDV3D", Luciana Backes discorre sobre como o desenvolvimento das TDVs possibilita a ampliação dos espaços de relação e interação entre os seres humanos, modificando, assim, a forma de viver e conviver em espaços digitais virtuais, fazendo emergir outra cultura que configura o pensar, as ações e as reflexões das novas gerações. A autora ainda enfatiza que a educação tem como comprometimento qualificar o processo de reflexão, a fim de que as novas gerações tenham consciência sobre o seu pensar e o seu agir, nos espaços acima citados.
         O artigo de número oito tem como título "Inovações educacionais versus cultura escolar: as implicações dos paradigmas de formação docente e da incorporação do uso pedagógico das TICs aos processos escolares". Nele as autoras Luciene Aparecida da Silva e Lucília Regina de Souza Machado abordam as tensões emergentes do antagonismo entre a demanda pelo fomento à disseminação das inovações educacionais e a cultura escolar vigente. Assim, o uso pedagógico das TICs nos processos educacionais escolares é problematizado como estratégia promissora à indução da cultura de trabalho docente colaborativo.
         No artigo nove, Sílvia Meirelles Leite, Patricia Alejandra Behar e Maria Luiza Becker apresentam o texto de título "A ação de projetar Ambientes Virtuais de Aprendizagem: relações entre a construção de formalizações e a criação de novidades". Nele as autoras discutem a relação entre a construção de formalizações e a criação de novidades na ação de projetar Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVAs), apresentando um estudo de caso sobre essa ação, enfocando o jogo entre forma e conteúdo, que caracteriza a ação de projetar, de modo que os observáveis apontados e as coordenações realizadas pelos projetistas se configuram como os observáveis desse estudo.
         No décimo artigo, Valéria De Bettio Mattos apresenta texto intitulado "Ambientes Virtuais de Aprendizagem: um relato da capacitação online de professores para utilização de softwares da coleção Educação Digital do Sistema "S". Nele é apresentado estudo sobre a capacitação a distância de funcionários do Sistema "S" sobre recursos didáticos.
         O décimo primeiro artigo é de autoria de Leandro Petarnella e Maria Lucia de Amorim Soares, intitulado "A tensão modernidade/pósmodernidade como força propulsora das simbioses contemporâneas e o cotidiano escolar". Nele os autores nos levam a refletir sobre as implicações das tecnologias na mutação social e no  cotidiano escolar. Para tanto, buscam na mitologia elementos para concluir, dentre outros aspectos, que, na tensão modernidade/pós-modernidade, está em curso a emergência de um novo sujeito, de um novo lugar, de novas demandas para a educação.
         Na sequência, temos cinco resenhas: a primeira do livro "Homo Zappiens: educando na era digital", de Wim Veen e Ben Vrakking, elaborada por Leandro Petarnella e Eduardo de Campos Garcia; a segunda do livro Pesquisando fundamentos para novas práticas na educação on-line, de Maria Cândida Borges de Moraes, elaborada por Marcelo Prado Amaral Rosa; a terceira do livro Games em educação: como os nativos digitais aprendem, elaborada por Cristina M. Pescador e a quarta do livro A inteligência coletiva: por uma antropologia do ciberespaço, de autoria de Celso Samir  Guielcer de For.
         E por fim apresentamos a tradução do texto de Marc Prensky, cujo título é O papel da tecnologia no ensino e na sala de aula. Nele o autor provoca a reflexão sobre o devir da educação, no contexto das tecnologias, destacando que seu único papel deveria ser o de apoiar os alunos no processo de ensinarem a si mesmos, sob a orientação de seus professores.
         Finalizando, em nome da direção do Centro de Filosofia e Educação, do coordenador do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade de Caxias do Sul e em meu próprio, agradeço aos autores a valiosa contribuição a esse número da Revista Conjectura.
         As reflexões aqui oferecidas aos leitores, pesquisadores e professores é um convite para pensarmos nos processos educativos mediados pelas tecnologias que podem ser catalisadores de novos modos de ser, conhecer e conviver.

    Eliana Maria do Sacramento Soares
  • Vol. 15 No. 1

         “Educação e processos identitários” constituiu o tema central da chamada de artigos para o v. 15, n. 1, ano de 2010 da Revista Conjectura. Com esse foco pretendeu-se dar relevo aos desafios da educação contemporânea, tendo como viés os processos identitários que transversalizam as práticas educativas cotidianas. Como resposta, os vários artigos aqui publicados, resultado de pesquisas concluídas e/ou em andamento, trazem à cena educativa alguns possíveis entrelaçamentos estabelecidos nos processos educativos formais, não formais e informais.
         Nas análises presentes no conjunto dos artigos, observam-se múltiplas pertenças seduzindo o olhar dos pesquisadores, fazendo emergir reflexões que tomam como pano de fundo os aspectos culturais, sociológicos, políticos, filosóficos, históricos e antropológicos das práticas educativas.
         Considerando que os processos identitários acontecem e se desenvolvem nos vários domínios da vida social e que já não é mais possível falar em identidades unificadas, faz sentido observar a educação através de vários ângulos, combinando olhares entre: educação e as identidades de gênero; educação e as identidades juvenis; educação e as culturas da infância; educação e as identidades docentes; educação e as identidades étnicas e religiosas; educação e as identidades narrativas; educação, currículo e identidades narrativas.
         Através das suas reflexões, os autores dos dez artigos e das duas resenhas impressas neste volume nos possibilitam transitar por um panorama diverso de relações possíveis entre educação e processos identitários. Eles nos apresentam suas reflexões, seus pontos de partida e os caminhos percorridos na busca de respostas possíveis, construídas em seus percursos investigativos.     Começando pelo artigo de Ana Lúcia Leal, Ferdinand Röhr e José Policarpo Júnior “Resiliência e espiritualidade: algumas implicações para a formação humana” temos acesso a uma interessante reflexão sobre algumas alternativas de enfrentamento do caráter multidimensional, imprevisível e imediatista do cotidiano escolar, valendo-se da resiliência e da espiritualidade como elementos importantes a serem considerados na formação do professor.Milena Aragão e Lúcio Kreutz trazem para debate acadêmico a posição da Educação Infantil na sociedade e na cultura, analisando as representações culturais sobre a mulher professora no processo de construção de sua identidade profissional. Através do artigo “Considerações acerca da Educação Infantil: história, representações e formação docente”, os autores analisam as questões de gênero presentes ao longo da história, especialmente na identidade dos docentes que atuam na primeira infância.
        Ainda com foco na Educação Infantil, João Alberto da Silva e Júnior Saccon Frezza abordam aspectos psicogenéticos implicados nos processos de construção das noções de tempo e de espaço das crianças, observando também a ação dos professores como mediadores no desenvolvimento de tais conceitos.
         Sob o ângulo das identidades narrativas, Deniz Alcione Nicolay, em tom literário, nos traz “A máscara de Emílio”, analisando a identidade infantil presente na obra de Rousseau, através das narrativas reflexivas de Emílio. Como o próprio autor nomeia, “desenvolve-se no artigo a textura de uma máscara que encontra na linguagem a fórmula pulsante de sua expressão”.A relação entre educação e identidades étnico-raciais é analisada por Alan Augusto Moraes Ribeiro. Sob o título “No meio e misturado: o moreno como identificação de cor entre estudantes de uma escola pública”, o autor desenvolve argumentos em torno dos processos identitários segundo um sistema de classificação de cor, valendo-se dos instrumentos da antropologia para pensar o “moreno” como categoria social.As identidades juvenis são analisadas por William de Goes Ribeiro no artigo “Multiculturalismo, juventude e formação do professor: potenciais para uma discussão sobre a diferença”. Valendo-se do banco de teses disponíveis no Portal da Capes, o autor observa a articulação da dimensão multicultural envolvida nas perspectivas de professores e jovens, interrogando sobre a dualidade identidade/diferença na luta contra preconceitos e estereótipos.     A relação entre juventude e escola é o alvo de Mariane Brito da Costa. Em seus argumentos, recupera reflexões sobre a função da escola como locus de socialização e problematiza o distanciamento existente entre as culturas juvenis e as culturas escolares, no texto: “As diferentes manifestações da juventude na escola: uma visão dos impasses e das perspectivas: “Dança, gênero e sexualidade: um olhar cultural” é o título do artigo de Giuliano Souza Andreoli, no qual são analisados o conceito de gênero, sua relação com a educação e as representações hegemônicas sobre os corpos femininos na dança.Em “Uma escola para todos e para cada um: escola inclusiva, uma comunidade de aprendizes”, Judithe Eva Dupont Ló traz um tema recorrente nas produções discursivas dos educadores que se veem diante de desafios da inclusão na escola regular e que ainda carece de reflexões e de mediações entre o real e o ideal.    
         As identidades de aprendizes permeiam o texto de Roque Moraes: “O significado do aprender: linguagem e pesquisa na reconstrução de conhecimentos”, defendendo a linguagem e a pesquisa como elementos centrais nos processos de ensinar e aprender e, portanto, considerados como princípios da aprendizagem.     Finalizamos este volume com duas resenhas. Na primeira, Gabriele Vieira Neves traz uma importante discussão sobre a obra de Karin Strobel intitulada “As imagens do outro sobre a cultura surda”. Na segunda, Sueli Salva nos apresenta a obra do sociólogo italiano Alberto Melucci, abordando a questão das identidades nas sociedades complexas: “O jogo do eu: a mudança de si em uma sociedade global”.
         Observando o espectro de temas apresentados nesta edição da Revista Conjectura, em torno da relação educação e processos identitários, podemos visualizar as urgências que penetram e/ou tangenciam a formação e a atuação docentes. Esperamos que os artigos aqui publicados suscitem diálogos e fertilizem práticas inovadoras, capazes de nos mobilizar em direção aos enfrentamentos necessários para a superação dos desafios da educação contemporânea.

     

    Nilda Stecanela
    Organizadora

  • Vol. 14 No. 3

               A paz é fruto da justiça, da solidariedade e da educação responsável

         A paz é fruto indissociável da justiça, da solidariedade e da educação responsável. É atitude comportamental. É processo educacional. Caracteriza-se pela busca contínua do diálogo. É enfrentamento de conflitos. É tentativa incansável de resolução de conflitos sem causar mais violência às partes envolvidas. A paz não é simples slogan de passeatas nem apenas ausência de guerras e tampouco simples estado de espírito. É compromisso inadiável, responsável e solidário com a cultura da paz.
         A realidade complexa de violência, em escala crescente, questiona todos nós. Não é possível simplesmente aceitar a situação de violência em que nos encontramos atualmente sem, no mínimo, problematizar tal realidade e buscar o porquê de tanta violência e de tanto desrespeito aos direitos humanos numa época de avanços, outrora, inimagináveis. Não é possível aceitar explicações simples seja por parte de quem for: das instituições de ensino, da política governamental, das Igrejas ou do senso comum. É urgente analisar o fenômeno da violência como problema de investigação, na tentativa de compreensão da natureza humana em sua totalidade. A paz, na medida em que se opõe à violência, é encarada como problema de investigação e aprofundamento. É tentativa de compreensão do problema em sua totalidade, não sendo a violência uma invenção ou acontecimento isolado do século XXI. Ao longo da história da humanidade, sempre houve uma preocupação com a convivência pacífica, não obstante, no decorrer dos séculos, a compreensão não tenha sido a mesma. Especialmente, a partir da modernidade, tem-se a compreensão de que a paz não é natural. Constitui-se numa construção racional possível sobre o alicerce do Direito e da justiça.
         A paz é um processo progressivo, ainda que natingível em sua plenitude. A paz não é um conceito estático. Não é simplesmente ausência de guerra, pois nenhuma paz está ao abrigo de toda ameaça de guerra. É um processo dialógico e não violento de respeito e construção coletiva. É a capacidade de instauração do diálogo incansável. Significa dizer que trabalhar pela paz implica engajamento, esforço, sacrifício. É compromisso inadiável de cada um e de todos. É a capacidade de assumir com responsabilidade os conflitos existentes e emergentes, buscando resolvê-los sem causar mais violência. Significa assumir com convicção e paixão a educação como possibilidade de instauração da paz.
         Para contribuir com o debate na comunidade acadêmica, resolvesse reservar e dedicar o terceiro número de 2009 da Revista Conjectura à reflexão da cultura da paz, intitulando a temática deste número de "Paz, justiça, direitos humanos e educação." Para auxiliar na reflexão, foram escritos, na perspectiva proposta, nove artigos e quatro resenhas.
         O primeiro artigo foi escrito pelo Prof. Dr. Paulo César Nodari da Universidade de Caxias do Sul (UCS) e busca estabelecer argumentos que sustentam a urgência de uma cultura e ciência da paz, esboçando, em linhas gerais, a importância do contexto moderno, especialmente, do texto kantiano, À paz perpétua, sobretudo, porque Kant fundamenta a ideia de que a paz é projeto de construção da razão, alicerçado no Direito. Com essa explanação introdutória à temática, o Prof. Dr. Celso de Moraes Pinheiro da Universidade Federal do Paraná (UFPR), no segundo artigo, analisa os textos, À paz perpétua e Sobre a pedagogia, mostrando que a teoria da paz, apresentada por Kant, tem, ainda hoje, uma importância fundamental nos debates acerca das relações internacionais, sobremaneira, no que diz respeito à defesa dos direitos humanos como a base para a validade de leis internacionais e para a legitimação da soberania nacional e as regras do Estado.
         Dando continuidade à temática, buscando a fundamentação e a colaboração de pensadores mais próximos de nossos dias, destacamos a relevância de três artigos. Nesse segundo bloco, o terceiro artigo foi escrito pelo Prof. Nilo Ribeiro Júnior da Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (Faje) e versa sobre a intriga entre ética e alteridade a partir do enigma do rosto do outro no pensamento de Emanuel Lévinas, partindo do fato de que a visitação do rosto inaugura uma sabedoria mais antiga e mais original do que a do saber e do pensamento provenientes da razão, mostrando, nesse sentido, que o conteúdo da ética da alteridade, associado à lição do rosto, veicula uma nova concepção de paz, que se constrói como solidariedade contra a exacerbação do individualismo. O quarto artigo, escrito pelo Prof. Dr. Federico Altbach- Núñez do Instituto Superior de Estudos Eclesiásticos da Arquidioceseda Cidade do México (Isee), centra-se na significativa contribuição de Jürgen Habermas para a compreensão tanto do mundo urbano como também das ciências da educação, mostrando que uma educação orientada comunicativamente pode ser um elemento decisivo para fazer da racionalidade comunicativa uma opção considerável para construir uma sociedade urbana melhor. O quinto capítulo é do Prof. Dr. Álvaro Mendonça Pimentel da Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (Faje), em Belo Horizonte. O artigo centra-se no exame das contribuições do pensamento social de Maurice Blondel para a promoção de uma paz duradoura entre as nações. A partir da crítica blondeliana dos totalitarismos e dos regimes liberais, o autor destaca algumas características da ação humana histórica e concreta, individual e social, que fundamentam uma concepção social e política favorável à pluralidade das culturas e à colaboração entre os povos.
         Num terceiro bloco de reflexões, temos três artigos muito importantes para refletir sobre a cultura da paz. A primeira dessas três reflexões foi escrita pela Profa. Dra. Karen Franklin, da Universidade Federal do Paraná (UFPR). A autora argumenta acerca das dificuldades e dos desafios da educação diante da questão dos direitos humanos, apresentando algumas concepções necessárias para a conquista do conceito de humanidade através de uma convivência ética e pacífica. A segunda reflexão desse terceiro bloco foi escrita pelo Prof. Dr. Daniel Loewe, pesquisador de filosofia política na Escola do Governo da Universidade Adolfo Ibáñez, em Santiago do Chile. Ele descreve três tipos de conflito que, usualmente, podem ser identificados nas sociedades culturalmente diversas e sustenta que um modelo de educação multicultural, denominada por ele "Educação Multicultural Inclusiva", pode ser o gestor do entendimento, da interação e da cooperação social. A terceira reflexão foi escrita pelo Dr. Dom Irineu Rezende Guimarães, monge beneditino, Prior do Mosteiro da Anunciação do Senhor, em Goiás. Segundo ele, não obstante os meios de comunicação exponham as diversas faces da violência, o fato é que se está vivendo, em todos os cantos do mundo, um período de muito interesse, criatividade e empenho na luta pela paz. E para explicitar isso, seu texto buscará articular quatro pontos: 1) estabelecer a questão fundamental da educação e da cultura da paz, discernindo seu objetivo e escopo fundamental; 2) delinear a habilidade fundamental a ser desenvolvida no processo de educação para a paz, a formação da competência comunicativa; 3) descrever as características fundamentais da metodologia da educação para a paz: a formação decomunidades, o espaço do debate e a ação para a paz; 4) relacionar, finalmente, esses aspectos da educação para a paz com as novas tecnologias.
         Por último, apresentamos um texto escrito pelo Prof. Dr. Mauro Meruzzi, da Pontificia Università Urbaniana de Roma. Ele intenta mostrar que o tema da paz em nossos dias se aproxima muito do conceito bíblico de shalom. Segundo ele, a paz é realização gradual do projeto criacional de Deus. É a construção de um modo de viver social que garanta estímulos de autêntica humanização para cada um e para todos.
         E, para finalizar, em nome da Direção do Centro de Filosofia e Educação, do coordenador do programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade de Caxias do Sul, agradecemos aos autores das reflexões aqui contempladas, bem como aos mestrandos do referido Programa pelas resenhas apresentadas neste terceiro número da Revista Conjectura. Além disso, um agradecimento muito especial ao Prof. Dr. Everaldo Cescon e à sua esposa Cláudia Vanessa de Jesus Loureiro Cescon, pela distinta colaboração.

    Prof. Dr. Paulo César Nodari
    Prof. Dr. Everaldo Cescon
    Organizadores

  • Vol. 14 No. 2

    A língua se deduz da necessidade do homem de expressar-se, de exteriorizar-se. (BAKHTIN, 2000, p. 289)

     

    A Revista Conjectura é uma publicação que completa, em 2009, catorze anos. Surgiu como uma ação do Centro de Filosofia e Educação da Universidade de Caxias do Sul. A partir de 2008, com a implementação do PPGEd/UCS, a revista passou também a pertencer ao Programa, como um veículo que divulga e acolhe reflexões que dialogam com suas linhas de pesquisa. Outras mudanças têm ocorrido visando à qualificação do periódico, como, por exemplo, a circulação de três edições anuais, a publicação impresa, além da online.

    O ser humano é um ser de linguagem, constitui-se na e por meio da linguagem. Pode-se afirmar que o ser humano tem outra peculiaridade: pode se transformar, se educar no decorrer da sua existência. Enquanto viver estará em processo de transformação. Pautado nesses dois aspectos da condição humana - linguagem e educação -, o volume 14 da Revista Conjectura elege, como tema desta edição, questões acerca da Educação e da Linguagem.

    Que conjecturas se podem fazer a partir das relações estabelecidas entre Educação e Linguagem? A resposta a essa questão norteia os artigos que compõem esta publicação, elaborada a partir de ementa que visou a orientar a chamada de artigos.

    Esta edição da revista, portanto, é constituída de artigos, entrevistas e resenhas focalizando a temática eleita. Os artigos estão organizados em três eixos: a) letramento: os desafios do ensino; b) a formação do leitor literário; e c) mediação literária: propostas de oralização.

    O primeiro eixo da revista - Letramento: os desafios do ensino - é composto por seis artigos. O primeiro "Apropriação da linguagem, escrita e ensino" focaliza a apropriação da linguagem escrita no processo de alfabetização, pela apresentação de resultados de pesquisa realizada pela Profa. Dra. Cláudia Maria Mendes Gontijo (UFES). Reflexões acerca do processo ensino-aprendizagem na compreensão do texto escrito, da Profa. Dra. Onici Claro Flôres (Unisc) e da mestranda Aline E. Pereira (Unisc) é o segundo artigo, cujo título é "O ensino e aprendizagem da compreensão do texto escrito". A mestranda Gislaine Gracia Magnabosco (UEM), em "Hipertexto e gêneros digitais: modificações no ler e escrever?", discute uma das modalidades de leitura e escrita presentes na contemporaneidade. A sistematização de uma experiência com o ensino de Língua Materna no Ensino Superior é apresentada pela Profa. Neiva Maria Tebaldi Gomes (UniRitter), no texto "Produção de narrativa e autoria". O registro e experiências também é a proposta apresentada no artigo "Oficinas pedagógicas: relato de uma experiência", da Profa. Dra. Neires Maria Soldatelli Paviani (UCS) e da profa. Ms. Niura Maria Fontana (UCS). O último artigo desse bloco atém-se a questões ligadas à linguagem matemática e à Língua Portuguesa, a partir de estudos da mestranda Edi Jussara Candido Lorensatti (UCS), no artigo "Linguagem matemática e Língua Portuguesa: diálogo necessário na resolução de problemas matemáticos".

    Formação do leitor literário é o foco do segundo eixo da revista. As professoras Dra. Renata Junqueira de Souza (Unesp) e Dra. Cyntia Graziella Guizelim Simões Girotto (Unesp) abrem esse bloco com o artigo "Da leitura escolarizada à leitura literária: a trajetória na formação do leitor", a partir de investigação realizada com estudantes do Ensino Fundamental. A Profa. Dra. Eliane Santana Dias Debus (Unisul) e a bolsista Margarida Cristina Vasques (Unisul), no texto "A linguagem literária e a pluralidade cultural: contribuições para uma reflexão étnico-racial na escola", têm como meta dar visibilidade às leituras literárias, destinadas aos públicos infantil e juvenil, que enfatizem o tema étnico-racial. A Profa. Dra. Cecil Jeanine Albert Zinani (UCS) realiza um estudo de gênero a partir da obra O mágico de Oz, no artigo "Literatura e gênero: vetores para a formação do leitor". Ainda tendo como foco o gênero, a Profa. Dra. Salete Rosa Pezzi dos Santos (UCS) escreve "Literatura infantil e gênero: subjetividade e autoconhecimento", que estuda a personagemnarradora da obra Bisa Bia, Bisa Bel, de Ana Maria Machado.

    Como as obras só ganham sentido pela leitura, e a leitura literária pressupõe um processo mediador, o terceiro eixo da revista trata da Mediação literária: propostas de oralização. "Reflexões sobre a contação de histórias: uma proposta para integrar oralidade, leitura e escrita", do Prof. Dr. Felipe Gustsack (Unisc) e das mestrandas Ana Luisa Brandt (Unisc) e Juliana Feldmann (Unisc), procura apresentar contribuições da contação de histórias para o desenvolvimento das linguagens nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental. "Vamos cantar histórias?", da Profa. Dra. Leila Mury Bergmann (UFRGS) e da Profa. Maria Cecília A. R. Torres (IPA), apresenta possibilidades de abordagens que envolvam literatura infantil e músicas. "Contação de história: uma análise da escolha de histórias em um recorte de experiências gaúchas", escrito pelo Prof. Dr. Edgar Roberto Kirchof (Ulbra) e pela Profa. Dra. Rosa Maria Hessel Silveira (Ulbra), discute relatos de observação de contação de histórias na região metropolitana de Porto Alegre. E, por último, "Jornadinhas de Literatura de Passo Fundo formando leitores - em foco a 4ª. Jornadinha", da Profa. Dra. Fabiane Verardi Burlamaque (UPF) e da Profa. Ms. Adriana Röhrig, analisa o papel das Jornadinhas de Literatura na formação de leitores de 10 anos de idade.

    Esta edição contém, ainda, duas entrevistas que contemplam o tema proposto: a da Profa. Dra. Irandé Antunes (UEC) que, em visita à Universidade de Caxias do Sul, concedeu à revista acerca do ensino de Língua Portuguesa, discorrendo sobre repercussões e políticas ligadas ao Ensino undamental. E também, com passagem pela UCS, por ocasião do V Siget, a do Prof. David Russel (Universidade de Iowa - EUA), entre várias atividades, concedida à Conjectura, abordando peculiaridades do ensino de língua, com enfoque na produção textual, na formação universitária.

    O último segmento da revista é formado por três resenhas de publicações contemporâneas. As obras, História da organização do trabalho escolar e do currículo no século XX: ensino primário e secundário no Brasil; Competência discursiva e gêneros textuais: uma experiência com o jornal de sala de aula; Como usar a biblioteca na escola: um programa de atividades para a Pré- Escola e o Ensino Fundamental, são resenhadas, respectivamente, pelas mestrandas do PPGEd/UCS, Roseli Maria Bergozza e Deline Farenzena e pela bolsista da Fapergs Nathalie Vieira Neves.

    Flávia Brocchetto Ramos
    Neires Maria Soldatelli Paviani

  • Vol. 14 No. 1

        Com satisfação, apresentamos o volume 14, n.1 de 2009 da revista Conjectura. Os textos presentes neste número abordam diversos temas ligados à filosofia e à educação.
        Em seu artigo, Liberale Ausbildung und multikulturelle Forderungen, Daniel Loewe afirma que a defesa liberal da educação escolar não é compatível com as demandas multiculturais, por excluir crianças de algumas exigências curriculares gerais por meio de exceções como, por exemplo, a que o Amish adquiriu em Yoder. Esta tese é defendida pela concepção de educação liberal,que inclui considerações paternalistas.
        Jaqueline Stefani propõe no seu artigo, O logos em Heidegger: lógica,verdade e metafísica, repensar a linguagem não mais como um instrumento do qual o sujeito se apropria e desapropria de acordo com a própria vontade, mas como a própria casa do ser, no sentido heideggeriano do termo. Segundo a autora, a partir de Heidegger é desenvolvida a questão de como a fenomenologia se transforma em hermenêutica e de como a autocompreensão surge paralela a toda compreensão. A filosofia autêntica é aquela na qual, ao se questionar sobre algo, o sujeito é inserido na própria questão.
        Em O cotidiano como fonte de pesquisa nas ciências sociais, Nilda Stecanela faz um contextualização teórica a respeito dos fundamentos da sociologia da vida cotidiana, valendo-se dos seus princípios para o desenvolvimento da pesquisa em ciências sociais e da sua utilização como perspectiva metodológica. Nos percursos argumentativos, situa o cenários e os sujeitos da pesquisa, sinalizando alguns instrumentos necessários para a escavação do cotidiano. No percurso do texto, tematiza os desvios das rotas do cotidiano e os desafios para a decifração dos seus enigmas. Procura, ainda, entrelaçar os aportes teóricos de Machado Pais e Melucci no tocante às metodologias de pesquisa qualitativa com os caminhos investigativos.
        Sônia Matos, no texto A didática e suas forças vertiginosas, aborda questões revelantes sobre didática e currículo, fazendo interlocuções com outras áreas do conhecimento como a filosofia, a história da ciência e história da arte. O leitor vai encontrar duas forças que produzem e produziram as didáticas: as vertigens da modernidade e as da pós-modernidade. Essas forças vertiginosas traçaram territórios diferenciados nas propostas de currículos e de planejamento.
        Em Aristóteles e a ação humana, Sônia Maria Schio, afirma que a ética aristotélica baseia-se em uma teoria da ação humana. Na sua visão, para fins de compreensão didática, ela pode ser decomposta em etapas e analisada em seus componentes. Dessa forma, pode-se avaliar os diferentes papéis desempenhados pela virtude e pela prudência, entre outros. A ética teleológica de Aristóteles parece portar componentes deontológicos, o que torna o estudo,além de importante, também filosoficamente interessante.
        Vital Corbellini, em seu artigo A relação: os padres da Igreja com a educação antiga, afirma que os padres da Igreja receberam uma educação dentro do sistema grego romano que visava a tornar as pessoas cidadãs, membros da vida civil e comunitária. Pela educação eles se tornavam pessoas livres, capazes de coordenar serviços na sociedade. Essa era uma educação básica, popular, que possibilitava o conhecimento das ciência na época. A filosofia delineava valores comunitários e sociais. Eles frequentavam as escolas normais que o Império Romano oferecia a todos os povos dominados. Trata-se de um texto que dá uma visão de como os padres encararam a educação e de como a viveram em seu tempo.
        Alice Maggi, em seu artigo Vulnerabilidade e proteção: a prática e a pesquisa em psicologia, estabelece ligações entre os conceitos clássicos principalmente na área da filosofia e demais ciências humanas, como a ética, a moral e a educação, bem como as circunstâncias cotidianas e contemporâneas,
    como o acesso facilitado às informações, o incentivo à formação de recursos humano na área da pesquisa e o desenvolvimento tecnológico das últimas décadas, tendo como meta indicar alternativas práticas e possíveis para operacionalizar a manutenção da pesquisa no contexto da vulnerabilidade e, ao mesmo tempo, para garantir o cumprimento das recomendações éticas vigentes.
        Em Educação Superior e sociedade do conhecimento: entre as orientações econômicas e pedagógicas do Banco Mundial na década de 1990, Cezar Luiz de Mari afirma que a década de 1990 e início do século XXI são marcados por reformas que atingem as estruturas do Estado brasileiro e com ela também a educação superior. Reformas que recambiam a noção de direito público à educação, conhecimento, a função do Estado, financiamentos, regidas pela agência Banco Mundial. Segundo a autor, nesse movimento a terminologia
    “sociedade do conhecimento” emerge como fundamento epistemológico condicionando à universidade o papel de produtora de conhecimentos de valor econômico e de consenso. Mobiliza-se assim, um conjunto de orientações e discursos de agentes nacionais e internacionais para dar legitimidade às reformas tornando a educação superior objeto crescente de disputa de mercados e de espaço de resolução de problemas da pobreza e do desenvolvimento.
        Agradecemos a todos os colaboradores e desejamos uma boa leitura.

    Paulo César Nodari e Everaldo Cescon
    Organizadores

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